quinta-feira, agosto 31, 2006

provavelmente




"(...) And when you're out there,without care
Yeah I was out of touch
But it wasn't because I didn't know enough
I just knew too much

Does that make me Crazy?
Does that make me Crazy?
Does that make me Crazy?
Possibly

And I hope that you are havin' the time of your life
But think twice, that's my only advice

Come on now who do you, who do you, who do you, who do you
think you are, ha ha ha, bless your soul
D'you really think you're in control

(...)

But maybe I'm Crazy
Maybe you're Crazy
Maybe we're Crazy
Probably..."


Há coisas que não são para se apanhar. Antes deixar arrepiar espinha acima, perder a razão, deixar escorrer dentro e à flor da pele.
Nós, eu, tu... provavelmente fomos, somos...

restos


Trago comigo instantes suspensos no tempo. Daqueles que parecem nunca ganhar pó nas gavetas para onde atiramos a vida que já usámos. por estar laça, apertada, rota, rafada, gasta, fora de tempo ou de moda.
Despidos dos trapos que antes me distraiam ou encadeavam, assaltam-me hoje dentro de silêncios e de olhares desconhecidos. Encontro-os nos bolsos de outros corpos, nas cores de outros lugares. Chegam-me embrulhados em sons, mais ou menos melodiosos, em restos de noites e de amanheceres.
Resquícios de mim e do que toquei. Todos foram e ficaram. Nenhum se me roubou ou se perdeu no atropelo dos dias, na turbulência das vontades. Todos me devolvem bocados do que foi e do que fui. Todos restaram e permanecem.
Afinal, as verdades que se vestem por dentro não se esquecem ou usam em segunda mão.

Fotografia: Christophe Kutner

quarta-feira, agosto 30, 2006

de volta



... a mim. onde quer que isso seja.

simplesmente

escarlate


Há poucas coisas que se amam num trago e sem razão que se entenda. que se saboreiam com vagar e consomem sofregamente quando é tempo delas. que vão bem com tudo e sem nada a acompanhar. que sabem melhor selvagens do que quando cultivados por querer. que nos fazem suspirar, perder o tino e esperar que voltem a nascer.
Estes frutos, vermelhos de nome, encaixam para mim nesta categoria de prazeres intensos, silvestres e temporários. Tu também. mas desta, encarnada eu por ti.
Tive-vos a ambos, ao mesmo tempo ou em separado. Hoje, quando já não é o tempo deles nem o teu, voltaria a provar-vos uma e outra vez. Todas as vezes.
É enquanto duram que estes pedaços de vida se devem saborear.

Fotografia: GettyImages

terça-feira, agosto 29, 2006

desintegrar-te

Já era tempo. O Amor não é como nos filmes, não se alimenta de ausências nem sobrevive do pingue pongue de toques inventados por imaginações carentes de adêene desconhecido. O Amor não é um grande plano de olhos fechados e de bocas entreabertas, com um magnífico pôr-do-sol de permeio e um piano piroso de fundo. Já era tempo, sabes. O Amor é uma janela que se fecha devagar para que não te constipes, é guardares-me a última colher de mousse e partilharmos a escova de dentes e o tédio das segundas à noite; é o riso cúmplice no velório de um primo distante e o depilar-me com a gilete com que te barbeias. Não, seguramente, esta estúpida nostalgia de violinos que se dispersa pelas minhas veias saudosas como veneno de cobra, a cada vez que me lembro de seguir um roteiro de palavras que não me pertencem porque já me esqueceram. Já era tempo de não tentar seguir-te o trilho, de perder a esperança de te encontrar as pegadas, às voltas, de volta, na minha direcção. Já era tempo de abrir os olhos, de virar-te a cara e cerrar-te os lábios (e que a noite caísse por fim entre nós). Seguir em frente. Sim. Já era tempo de seguir em frente.
Já era tempo de cortar o que cravaste cá dentro e deixar sangrar até estancar. Já era tempo de te desintegrar, a dentro.

Fotografia: Eryk Fiktau

domingo, agosto 27, 2006

amanhã

Há uma multidão de vontades, de conquistas e de perdas, de sorrisos, de cruzares de pernas e de danças sujas, de despedidas e de insónias, de desejo, de corpos suados e olhares cúmplices, de tragos, de copos cheios e vazios, de roupas arrancadas à pressa e beijos vestidos devagar, de nãos mentirosos e de verdades rasgadas, de lágrimas e de feridas por lamber, de lençois do avesso e de silêncios quentes, de perfumes, de gritos e de palavras despidas que se agitam. Esperam-me à espreita em todos os amanhãs que hão-de vir.
O bom da vida é que se regenera sempre sem nunca se repetir.

Fotografia: Juan Gatti

sábado, agosto 26, 2006

desatar-te

É com um nó na garganta que desato este outro mais fundo e emaranhado que me tem atado a esperança aos teus passos e prendido o coração aos teus olhos. Talvez um dia possa voltar a olhar para eles sem me lembrar de todas as vezes em que se fundiram nos meus e me esquecer de respirar.

Fotografia: Peter Lindbergh

la dolce vita

A de escoar o tempo sem pressas, com areia entre os dedos e sal no corpo. A do aquecer a alma no compasso de madrugadas mais claras e fins de tarde sem fim.
Massajar o que está dentro no embalo de um mar que é sempre o nosso por estes dias.

Fotografia: Norman Parkinson

procura-se

Todas as palavras não dizem o que ficava entre os meus olhos e os teus. O turbilhão que escorria das nossas bocas cerradas sem contenção. A tempestade de fogo e suor que nos nascia dos corpos.
Tudo se calou agora.
Tanto que sobra sem lugar em que caiba ou se apague.
Os despojos do vendaval que trouxeste e deixaste vão amainando cá dentro. Devagar.
Ando à procura de um silêncio onde possa morar despida de ti.

Fotografia: GettyImages

sexta-feira, agosto 25, 2006

una storia di amore


"Spero che questa storia vi sorprenda, vi distragga, vi inquieti, vi diverta e vi commuova. Forse sono troppe. Vabbè, ma anche una sola di queste già sarebbe una cosa straordinaria per un film", dizia Benigni sobre o que procurava despertar em quem assistisse a este pedaço de magia cinematográfica.
A mim, trouxe-me a grandeza das coisas pequenas, o amor desprovido de adereços, a ingenuidade e força de quem acredita, a esperança de quem não pode desistir, a simplicidade dos gestos, a música das palavras. O sorriso sempre e acima da tragédia e, claro, uma lágrima ao canto do olho.
A vida tece-se de emoções em bruto, como estas, todos os dias.

quinta-feira, agosto 24, 2006

quase pecado


"Eras tu a ficar por não saberes partir,
E eu a rezar para que desaparecesses,
Era eu a rezar para que ficasses,
Tu a ficares enquanto saías.

Não nos tocamos enquanto saías,
Não nos tocamos enquanto saímos,
Não nos tocamos e vamos fugindo,
Porque quebramos como crianças.

Afinal... Quebramos os dois, afinal...

É quase pecado o que se deixa.
Quase pecado o que se ignora."

Toranja

Fotografia: Erik Fitkau


quarta-feira, agosto 23, 2006

always 3

"It would be wonderful to say you regretted it. It would be easy. But what does it mean? What does it mean to regret when you have no choice?"
Laura Brown (Julianne Moore)
Fotografia: Francois Duhamel

always 2


"Dear Leonard. To look life in the face, always, to look life in the face and to know it for what it is. At last to know it, to love it for what it is, and then, to put it away. Leonard, always the years between us, always the years. Always the love. Always the hours."
Virginia Woolf (Nicole Kidman)
Fotografia: Clive Coote

always 1



"I remember one morning getting up at dawn, there was such a sense of possibility. You know, that feeling? And I remember thinking to myself: So, this is the beginning of happiness. This is where it starts. And of course there will always be more. It never occurred to me it wasn't the beginning. It was happiness. It was the moment. Right then."
Clarissa Vaughn (Meryl Streep)
Fotografia: Francois Duhamel

always

"The time to hide is over. The time to regret is gone. The time to live is now."
Tagline, The Hours
Muitas vezes é dentro de nós que se erguem as correntes que nos encurralam, sufocam ou aniquilam. As prisões em que moramos agrilhoadas no tempo.
Sobre as mentiras que (nos) contamos e as verdades a que não podemos fugir. O tique-taque da vida, na sua grandeza e fragilidade. The Hours, um filme intemporal.

little pleasures


O toque dos pés na areia, da areia nos pés. Os arrepios e as cócegas, o molhado ou o queimar, o afundar e o amaciar.
Daqueles pequenos prazeres que o verão traz e que pareço revisitar sempre pela primeira vez.
É bom relembrar que mesmo nas coisas mais simples nos podemos sentir a respirar.

Fotografia: GettyImages

sem norte


Os dias continuam a transbordar de ti em marés cheias da tua ausência. Todas as horas são uma sucessão de lembranças do teu cheiro a vazar-me o juízo, dos teus beijos a esmagarem-me o corpo e a alma. Até o mar teima em murmurar-te. Ontem rebentou-te tantas vezes quantas as que os teus braços estiveram a menos para me resgatar e roubar o fôlego.
São poucos os momentos em que consigo despedir-me de ti. Não porque não possa, mas porque não quero. Não quero ser náufraga de um amor sem dono e sem rumo, sem saber encontrar o Norte depois de ti.
Em qual das verdades que me contaste escondeste a bússola para quando te perdesse?

Fotografia: Marta Glinska

domingo, agosto 20, 2006

no glory 5

(Larry:) " You think because you don't love us, or desire us, or even like us, you think you've won."
(Alice:) "It's not a war."

Fotografia: Stephen Goldblatt

no glory 4


"I think you owe me for deceiving me so exquisitely."

Fotografia: Stephen Goldblatt

no glory 3


"No one will ever love you as much as I do. Why isn't love enough?"

Fotografia: Stephen Goldblatt

no glory 2


"What's so great about the truth? Try lying for a change, it's the currency of the world."

Fotografia: Stephen Goldblatt

no glory 1



"Where is this love? I can't see it, I can't touch it. I can't feel it. I can hear it. I can hear some words, but I can't do anything with your easy words."

Fotografia: Stephen Goldblatt

no love, no glory


"Love is an accident... waiting to happen
Desire is a stranger... you think you know
Intimacy is a lie... we tell ourselves
Truth is a game... you play to win

If you believe in love at first sight, you never stop looking."

Closer - Perto demais
sobre o Amor, nu e cru.
o desejo. a paixão. a verdade. a mentira. os limites. a traição. a dor. o desespero. a vingança. o perdão. vezes 4 .
está tudo lá. escancarado, despido de clichés. como um pedaço de realidade esfarrapado e feito arte.
Sublime.


Siempre me quedará...


"Siempre me quedará

la voz suave del mar,

volver a respirar la lluvia que caerá

sobre este cuerpo y mojará

la flor que crece en mi,

y volver a reír

y cada día un instante volver a pensar en ti."

Bebe, "Siempre me quedará"

Bebe empresta-lhe a voz de água. Eu cito-o aqui, ainda que desprovido de som (...) Há tragos que vale a pena sentir... e partilhar.

Fica a sugestão.

Fotografia: Sophie Delaporte

sábado, agosto 19, 2006

um toque de beleza


por tudo o que permanece. os sorrisos. a vontade. o acreditar. o calor dos braços da minha mãe. a sensatez do meu pai. as túlipas. os meus manos quidos. o bolo de chocolate. os almoços de família de domingo. as minhas queridas. os amigos. as gargalhadas. os meus gatos. as conversas de café. e as servidas com martini. os primeiros beijos. os fins de tarde à beira mar. as noites à lareira. as horas mal dormidas. as rugas das minhas avós. os saltos altos. os olhares cúmplices. o tango. o teu perfume. as pipocas. o silêncio. todos os amanhãs.
a beleza dos instantes e das miudezas. a beleza sempre, onde menos se espera.


Fotografia: Claus Wickrath

prece


Que estas lágrimas me lavem os olhos encardidos de ti e eu enxugue, já sem o teu cheiro a matar-me aos poucos.
Que as distracções que o tempo me empresta esfreguem as nódoas com que me manchaste o corpo e a alma.
Que amanhã ou depois, ou depois, páre de sangrar o que um dia também te tingiu e encontre os meus sonhos imaculados de ti.
Até la, ficarei por aqui, a recolher os cacos deste coração que quebrou, sem e por querer.


Fotografia: Sophie Delaporte

Há corpos que ardem...



... o que as palavras não sabem verter.
É nos gestos mais simples que o divino parece tornar-se terreno ou o contrário.
A ele, aqui fica o meu aplauso.

Fotografias: Peter Lindbergh

de passagem


Vou passear esta saudade para longe de ti. Para perto de estranhos que me desconhecem as marcas que as tuas mãos já gravaram dentro do meu peito. Vou ao encontro de outro silêncio falso que empurre este que me aperta com força a vontade de me perder nos teus lábios. Uma e outra vez.


Fotografia: Peter Lindbergh

sexta-feira, agosto 18, 2006

remate


Já te perdi vezes sem conta. umas alinhavadas por mim, outras cozidas por ti. perdi-te mesmo antes de te ter. nunca remataste a tua chegada ou a tua partida.
Desta perdi-te de vez. sem ponta e sem nó.


Fotografia: Thierry Le Gouès

(des)arrumação


Lembro-me do dia em que os teus braços se fizeram âncoras do meu corpo e, entre saliva e soluços, sussuraste: "não tenhas medo, eu não vou embora". repetiste-o outras vezes. mais com os olhos do que com palavras. eu acreditei. fintei o medo que me encurralava por dentro e fiquei. tu partiste assim que ouviste o pousar do teu coração sobre este chão e fugiste a rebate do medo que afinal era teu. cedo demais.
por aqui, deixaste sorrisos teus espalhados pelos lençois, errudilhados nos sinais que te salpicam o corpo, o teu cheiro por lavar desta pele, os teus mil olhares amontoados no sofá, as gargalhadas e as tuas mãos entornadas na mesa da sala. pedaços de ti que te esqueceste de levar e que eu ainda não consegui arrumar ou deitar fora.
ainda hoje tropeço nas promessas que deixaste esquecidas por aqui e esbarro nos sonhos que plantaste neste peito por cumprir. são tantos os minutos que guardo em memória dos beijos que nunca chegámos a dar.
preciso de me desocupar de ti.

Fotografia: allposters

Porquê?


Nem para tudo na vida existe uma razão.
Este é um facto em que tropeçamos todos os dias, sem e por querer. Perde-se demasiado tempo à procura do porquê das coisas, sejam elas miudezas ou grandezas. Talvez seja um vicío que nos acompanha, desde aquela idade que tem por nome esta pergunta. Ou então não, e esta é apenas uma forma de esmiuçarmos o mundo, dentro e fora de nós, de nos tranquilizarmos, de nos revoltarmos, de controlarmos, de nos (des)responsabilizarmos, de nos sentirmos pior ou melhor acerca de quem somos... sei lá. Também para isto não acredito ter de haver uma resposta. É assim. Porque sim.
E nem sempre as razões estão lá, prontas para se nos escancararem por detrás do ponto de interrogação e nos fazerem a vontade. E não estão porque muitas vezes não existem ou não são relevantes. "porque é que não existem túlipas todo o ano?", "porque é que dizes que fico mais bonita quando estou irritada?", "porque é que a minha tia nunca se casou?", "porque é que o teu sorriso deixou de me acompanhar os passos?", "porque é que tiveste medo?", "porque é que o meu avó morreu antes de eu lhe conhecer os olhos?", "porquê...?". Porque sim. Porque as respostas nem sempre são o mais importante.
Também para o porquê da criação deste espaço não existe uma resposta. Talvez somente exista a pergunta e ela se va desvendando a mim e a vós enquanto aqui verterei o que de dentro se vá escapando na (des) arrumação dos dias. Sem e por querer.