quinta-feira, agosto 31, 2006

restos


Trago comigo instantes suspensos no tempo. Daqueles que parecem nunca ganhar pó nas gavetas para onde atiramos a vida que já usámos. por estar laça, apertada, rota, rafada, gasta, fora de tempo ou de moda.
Despidos dos trapos que antes me distraiam ou encadeavam, assaltam-me hoje dentro de silêncios e de olhares desconhecidos. Encontro-os nos bolsos de outros corpos, nas cores de outros lugares. Chegam-me embrulhados em sons, mais ou menos melodiosos, em restos de noites e de amanheceres.
Resquícios de mim e do que toquei. Todos foram e ficaram. Nenhum se me roubou ou se perdeu no atropelo dos dias, na turbulência das vontades. Todos me devolvem bocados do que foi e do que fui. Todos restaram e permanecem.
Afinal, as verdades que se vestem por dentro não se esquecem ou usam em segunda mão.

Fotografia: Christophe Kutner